Perdeu um processo? Entenda quando é possível ajuizar uma ação rescisória para reverter o julgamento

Perdeu um processo? Entenda quando é possível ajuizar uma ação rescisória para reverter o julgamento

Reverter Julgamento

Muitos acreditam que após esgotados todos os recursos em um processo judicial, não há mais nada que um advogado possa fazer. De fato, em grande parte dos casos a derrota é definitiva, porém, em certas hipóteses que serão demonstradas ao longo do presente artigo, é possível ajuizar uma ação rescisória com o objetivo de desconstituir o julgamento proferido no processo.

Diferente de Recurso

A rescisória não se trata de um recurso, mas sim de uma ação autônoma prevista no artigo 966 do Código de Processo Civil, que pode ser proposta, em regra, até 02 (dois) anos após a última decisão proferida no processo, com exceção de uma hipótese explorada adiante.

O ajuizamento da ação depende do depósito prévio de 5% sobre o valor da causa, fator que muitas vezes pode desestimular o interesse na rescisória. Todavia, é importante esclarecer que a legislação é expressa ao prever a possibilidade do pedido de gratuidade de justiça quando a parte não possui recursos financeiros para custear o processo, oportunidade em que, se deferida, isentará o autor do pagamento do depósito em questão.

O ponto positivo é que, em caso de procedência da ação, o depósito será restituído à parte ao final do processo.

Hipóteses de ajuizamento para reverter o julgamento

Superadas as questões formais, adiante serão tecidos breves e importantes comentários às hipóteses em que é cabível o ajuizamento da ação rescisória, nos termos do artigo 966 do Código de Processo Civil. Vale destacar que as hipóteses V e VII são as mais utilizadas e aceitas pela jurisprudência.

Poderá haver a rescisão:

I.         Quando verificado que a decisão foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz. Constatado o cometimento de qualquer um dos três crimes pelo juiz, é possível o ajuizamento da ação. Neste caso, não é necessário que haja condenação penal prévia, sendo possível a demonstração do ato ilícito no curso da rescisória.

II.       Quando a decisão for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente. Como exemplo de impedimento, podemos citar casos em que um parente do juiz atue no processo, sendo que as demais hipóteses podem ser encontradas no art. 144, do CPC. Já a incompetência absoluta é percebida quando, por exemplo, uma causa estritamente cível foi julgada por um juízo trabalhista.

III.     Quando a decisão resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei. Caso a parte vencedora utilize dolo ou coação para gerar um benefício processual ou se houver conluio entre partes do processo para conferir aparente legalidade a um ato ilegal, também caberá rescisória. Exemplo: O Autor coage um Réu a omitir determinada informação no processo.

IV.      Quando há ofensa à coisa julgada. Caso haja um julgamento de um processo e, posteriormente, haja outra ação com as mesmas partes, causa de pedir e pedido, caberá o ajuizamento da rescisória para desconstituir a segunda coisa julgada. Uma questão interessante nesta discussão é quando, após a segunda coisa julgada, finda o prazo de dois anos para ajuizamento da rescisória – qual processo prevalecerá? O Superior Tribunal de Justiça entendeu recentemente que será o segundo, porém a doutrina e a jurisprudência divergem sobre o tema.

V.        Violar manifestamente norma jurídica. Esta é a hipótese mais ampla, mais importante e mais utilizada pelos advogados. Neste caso, não pode haver uma simples interpretação diferente da norma, deve ser uma violação manifesta. Como “norma” pode-se entender: costumes, princípios gerais do direito, leis infraconstitucionais, regulamento de órgãos governamentais, tratados internacionais e precedentes vinculantes. Com base nesta hipótese também é possível analisar os autos do processo de forma detalhada a fim de constatar qualquer vício processual apto a ensejar a violação manifesta.

Ou seja, o campo para se trabalhar em uma ação rescisória com base nesta hipótese é amplo e pode ser explorado de forma extensa pelo operador do direito em benefício do cliente.

VI.      Quando a decisão for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória. Neste caso é necessário demonstrar o nexo direto entre a prova falsa e o resultado do julgamento. A falsidade pode ser tanto material, quando a parte cria um documento inexistente, ou ideológica, quando altera um documento verdadeiro.

VII.    Quando obtiver prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz de lhe assegurar julgamento favorável. Esta também é uma importante hipótese para ajuizamento da rescisória. Vale destacar que a prova neste caso não pode ter sido produzida posteriormente ao trânsito em julgado da decisão que se pretende rescindir. Deve ser uma prova já existente ao tempo da decisão, mas que a parte não sabia da existência ou por qualquer razão não pôde fazer uso. Além disso, o termo inicial para contagem do prazo de 02 (dois) anos para propositura da ação rescisória só se inicia quando descoberta a prova nova, observando o prazo máximo de 05 (cinco) anos contados da última decisão proferida no processo.

VIII.  Quando a decisão for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos. É um erro de fato manifesto que altera o julgamento do processo. Por exemplo, o juiz condena um médico por um erro cometido em uma cirurgia que ele sequer participou. Neste ponto é importante que o fato em questão não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.

Assim, demonstra-se que são múltiplas as hipóteses de ajuizamento da ação rescisória para desconstituir decisão final transitada em julgado, ou seja, aquela que não mais cabe recurso. Se esclarece ainda que é possível ajuizar a referida ação com fundamento em mais de uma hipótese, inclusive combinando-as.

Outro ponto que deve ser observado é que a propositura da rescisória, por si só, não impede a execução da decisão que se pretende desconstituir. Caso necessário, é possível requerer uma tutela provisória comprovando a urgência e o perigo de dano a fim de suspender a execução até o julgamento da ação rescisória.

A medida de desconstituição da decisão transitada em julgado ainda é pouco utilizada pelos operadores do direito, todavia, muitas vezes pode ser o único meio capaz de buscar a prestação jurisdicional em prol do cliente que foi previamente injustiçado pelo Poder Judiciário. Por isso considerar sua possibilidade e conhecer as hipóteses de cabimento é de suma importância.

Portanto, em resumo de tudo que foi demonstrado no presente artigo, podemos concluir que a rescisória é importante ação autônoma que visa desconstituir a coisa julgada. Para seu ajuizamento é necessário o depósito prévio de 5% sobre o valor da causa, o qual será restituído ao final em caso de procedência da demanda, devendo ser observada a gratuidade de justiça. Além disso, as principais hipóteses de cabimento são: quando há manifesta violação à norma jurídica e quando há prova nova não utilizada no processo anterior. Por fim, a utilização da medida é de extrema importância, apesar de pouco utilizada, para reverter eventual injustiça cometida pelo Poder Judiciário.

Leonardo Machado

Advogado integrante do escritório Battaglia & Pedrosa Advogados, formado e pós-graduando em Processo Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com atuação profissional na área cível.

leonardo@bpadvogados.com.br

0 comentários em “Perdeu um processo? Entenda quando é possível ajuizar uma ação rescisória para reverter o julgamentoAdicionar comentário →

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *