Cláusula de não concorrência em venda de quotas sociais

Cláusula de não concorrência em venda de quotas sociais

 Concorrência Quotas Sociais

 Concorrência Quotas Sociais

A cláusula de não concorrência estabelece em linhas gerais que o sócio que está vendendo sua participação na empresa não poderá restabelecer-se ou fazer concorrência no mesmo ramo de negócios da empresa da qual se retira, por determinado período, sob pena de multa.


Cuida-se de uma proteção para o adquirente das quotas, que naturalmente não quer ver seu negócio potencialmente esvaziado pela concorrência do ex-sócio, que muitas vezes tem controle sobre a carteira de clientes e capacidade para levar o faturamento para uma nova empresa. 

No contexto de venda do estabelecimento comercial como um todo (trespasse), não há dúvidas quanto à existência da cláusula de não concorrência, mesmo que não expressamente prevista no contrato, uma vez que o Código Civil, em seu artigo 1.147 estabelece que, não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes à transferência. Quem vende a empresa a um terceiro, portanto, não pode fazer concorrência com ele pelo período de cinco anos, por força de lei. 

Na cessão de quotas entre sócios

Contudo, quando tal cláusula é inserida no contexto de cessão de quotas entre sócios a questão se torna mais controversa. Majoritariamente, tem nossos tribunais entendido que o Art. 1.147 não tem aplicação quando o negócio celebrado é a cessão de quotas sociais entre sócios, pois não há nesse caso propriamente o trespasse, mas sim mera cessão. Nesse sentido, vide decisão abaixo, recentemente proferida pelo Tribunal de Justiça do

PELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA PARA FECHAMENTO DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EX-SÓCIO QUE CONSTITUIU NOVA EMPRESA NO MESMO RAMO DO ESTABELECIMENTO DO QUAL SE RETIROU. CONCORRÊNCIA DESLEAL. INOCORRÊNCIA. CONTRATO DE CESSÃO DE QUOTAS SOCIAIS QUE NÃO SE CONFUNDE COM TRESPASSE. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.147 DO CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA EXPRESSA NO CONTRATO DE CESSÃO DE QUOTAS SOCIAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR – 5ª C. Cível – 0021521-16.2019.8.16.0001 – Curitiba – Rel.: DESEMBARGADOR CARLOS MANSUR ARIDA – J. 30.05.2022) 

Em outras palavras, quando um sócio vende sua participação na empresa para outro sócio, nada impede que ele se restabeleça e faça concorrência com a sua antiga empresa. 

Para evitar que isso ocorra, porém, é possível estabelecer a cláusula de não concorrência de forma expressa no contrato de cessão de quotas, delimitando seu período de validade (em geral de 5 a 10 anos) e o valor da multa por eventual descumprimento. 

Há ilicitude em sua utilização?

Embora haja discussão sobre a validade de tal cláusula no contexto de cessão de quotas, por supostamente violar o princípio da livre iniciativa, entendemos que não há qualquer ilicitude em sua utilização. Isto porque, podem as partes, maiores e capazes, livremente estipular as cláusulas que regem o negócio celebrado entre si, desde que não sejam contrárias ao ordenamento jurídico ou defesas em lei e, no caso, não vislumbramos qualquer ilicitude, até porque o próprio Código Civil prevê sua validade para o caso análogo de trespasse. 

Nesse sentido, em recente julgado, o Tribunal de Justiça de São Paulo validou a cláusula de não concorrência estabelecida em contrato de cessão de quotas de empresa do setor de tecnologia, que estabelecia a impossibilidade do sócio vendedor fazer concorrência com o sócio comprador, por um período de 10 anos, sob pena de multa de 15 milhões de reais:

APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADEDE CLÁUSULA CONTRATUAL DE NÃO CONCORRÊNCIA CUMULADA COM COBRANÇA, AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E EMBARGOS ÀEXECUÇÃO. (…) Cessão de cotas sociais (…) Imposição de cláusula de não concorrência pelo prazo de 10 anos, sob pena de multa. Validade. As partes são experientes neste mercado e puderam sopesara alocação de riscos decorrentes do não exercício de exploração, pela cessionária, da tecnologia cedida. (…). Ausência de ilicitude. Prazo voluntariamente pactuado pelas partes. Inaplicabilidade do art.1.147 do CC. (…). RECURSO DESPROVIDO, NA PARTECONHECIDA. (TJSP 0034036-35.2018.

Portanto, a cláusula de não concorrência é válida em qualquer negócio societário. No trespasse, ela existe mesmo que não prevista pelas partes, pelo período de cinco anos. Na cessão de quotas, só existe se expressamente prevista em contrato, devendo as partes estabelecer seu prazo e valor de multa em caso de descumprimento. 

Paulo André M. Pedrosa

Autor da coluna “Direito & Negócios”, advogado, sócio de Battaglia & Pedrosa Advogados. Graduado em Direito pelo Mackenzie. Mestre em Direito Societário pela FGV. LL.M. Master of Laws em Direito Societário pelo INSPER. Especialista em Processo Civil pela PUC. Também cursou Contract Law pela Harvard Law School. Membro Efetivo da Comissão de Contencioso Societário e Disputas de M&A do IBRADEMP e Presidente da Comissão de Compliance da OAB-Santo Amaro, Gestão 2022-2024. 

pauloandre@bpadvogados.com.br

0 comentários em “Cláusula de não concorrência em venda de quotas sociaisAdicionar comentário →

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *