A responsabilidade sobre fraudes em anúncios de marketplace

A responsabilidade sobre fraudes em anúncios de marketplace

Responsabilidade Marketplace

Responsabilidade Marketplace

A pandemia do Covid-19 trouxe como uma de suas consequências indiretas a aceleração de avanços na relação entre empresas e consumidores, bem como na maneira como as vendas são realizadas no dia a dia. Aqueles que buscam um produto vêm aos poucos deixando de se dirigir às lojas físicas e passam a cotar os preços e adquirir seu item desejado junto à facilidade dos e-commerces.

Neste sentido, dados demonstram que apenas em 2021 houve um crescimento de 27% nas vendas realizadas pela internet, as quais movimentam em torno de R$ 161 bilhões apenas no Brasil.

Os benefícios da expansão do mercado online muitas vezes podem ser ofuscados por condutas ilícitas realizadas por indivíduos que se aproveitam das plataformas para a realização de atos fraudulentos.

Deste modo, o presente artigo possui como objetivo esclarecer qual é o entendimento dos tribunais acerca da responsabilidade do e-commerce marketplace – anunciante e intermediador – com relação às vendas fraudulentas realizadas em suas plataformas. Importante frisar que a política interna dos e-commerces não se confunde com o entendimento jurisprudencial sobre o tema, ou seja, determinadas empresas de vendas online oferecem uma garantia de que, em caso de fraude, haverá o ressarcimento do dinheiro despendido sem a necessidade de uma intervenção judicial.

Sendo assim, serão analisados os casos em que há a ocorrência da fraude sem o reembolso voluntário por parte da plataforma.

A responsabilidade civil e o marketplace

O debate ora apresentado, relativo à responsabilidade dos e-commerces marketplaces pelas fraudes cometidas no âmbito das plataformas, como qualquer tema no direito encontra divergência tanto na doutrina quanto na jurisprudência.

Vale esclarecer a princípio a distinção entre os: marketplace anunciante e marketplace intermediador. Aqueles são utilizados como verdadeiro ambiente de “classificados”, ou seja, seu lucro advém da venda de seu espaço para os anunciantes, como uma vitrine. Neste caso não há qualquer intermediação, sendo que a plataforma possui como objetivo final colocar o comprador e o vendedor em contato.

Já os marketplaces intermediadores são aqueles que comercializam bens de terceiros, que se cadastram previamente em sua base de dados. Os sites intermediários interferem diretamente na negociação entre anunciante e adquirente. Tal interferência pode ser parcial, se o negócio tem início na plataforma eletrônica e termina fora dela, ou total, quando realizado integralmente em seu site.

Pois bem, aqueles que defendem que as empresas devem ser responsabilizadas a arcar com o prejuízo financeiro decorrente das fraudes cometidas fundamentam seu posicionamento, principalmente, na participação das empresas na cadeia de consumo, tornando-as solidariamente responsáveis nos termos dos artigos 14 e 25, §1º, do Código de Defesa do Consumidor.

Ocorre que a análise da presença ou não na cadeia de consumo deve ser obrigatoriamente relacionada com a natureza da plataforma de e-commerce, ou seja, trata-se de mero anúncio ou há intermediação da compra e venda?

Muitas vezes na prática a questão não é de fácil distinção, tendo em vista que muitas plataformas podem atuar tanto intermediando as transações quanto apenas colocando as partes em contato.

Neste caso, como regra os tribunais, em recentíssimos posicionamentos, vem entendendo que situações em que a plataforma é utilizada apenas para anunciar o produto não pode haver responsabilização por eventuais fraudes relativas ao negócio jurídico celebrado entre as partes, tendo em vista que não há interferência direta na transação realizada fora da plataforma, sobre a qual não há sequer comissão ao e-commerce.

Vejamos:

1. A controvérsia posta nos autos cinge-se em saber se a sociedade empresarial que disponibiliza espaço para anúncios virtuais de mercadorias e serviços (no caso, a plataforma “OLX”) faz parte da cadeia de consumo e, portanto, deverá ser responsabilizada por eventuais fraudes cometidas pelos usuários. […] 3. Não obstante a evidente relação de consumo existente, a sociedade recorrida responsável pela plataforma de anúncios “OLX”, no presente caso, atuou como mera página eletrônica de “classificados”, não podendo, portanto, ser responsabilizada pelo descumprimento do contrato eletrônico firmado entre seus usuários ou por eventual fraude cometida, pois não realizou qualquer intermediação dos negócios jurídicos celebrados na respectiva plataforma, visto que as contratações de produtos ou serviços foram realizadas diretamente entre o fornecedor e o consumidor. 4. Ademais, na hipótese, os autores, a pretexto de adquirirem um veículo “0 km”, por meio da plataforma online “OLX”, efetuaram o depósito de parte do valor na conta de pessoa física desconhecida, sem diligenciar junto à respectiva concessionária acerca da veracidade da transação, circunstância que caracteriza nítida culpa exclusiva da vítima e de terceiros, apta a afastar eventual responsabilidade do fornecedor. 5. Recurso especial desprovido. (REsp n. 1.836.349/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 24/6/2022.)

Já com relação aos casos em que há a efetiva intermediação da plataforma que celebra a transação, disponibiliza meios de pagamento, fornece seu próprio transporte e retira sua comissão sobre a venda, entende-se que há sua participação na cadeia de consumo e que, portanto, merece responsabilização sobre eventuais fraudes cometidas.

Tendo em vista o recebimento de uma comissão pela venda, bem como os demais atos que tornam a plataforma parte integrante do negócio jurídico, é imposto a essas empresas o dever de fiscalizar atentamente os anúncios realizados por seus usuários, encargo que não pode ser transferidos aos terceiros porventura lesados pelo anúncio.[2]

No julgado acima mencionado o Min. Relator Marco Aurélio Bellizze do Superior Tribunal de Justiça ainda aponta para a conduta do consumidor, ponto que também será avaliado em eventual ação judicial:

Independentemente do cenário que se apresente, o consumidor também deve agir com diligência, haja vista os riscos inerentes ao comércio virtual. Geralmente, os sites que realizam a intermediação de negócios disponibilizam informações sobre os caminhos a serem adotados na concretização da operação para evitar a ocorrência de fraudes, devendo o usuário atentar-se a essas recomendações”.

Deste modo, é importante ressaltar o cuidado com o qual o consumidor deve agir quanto às compras realizadas online, sempre se atentando à elementos que demonstrem a veracidade daquele anúncio, como a reputação do vendedor, a quantidade de vendas, os comentários da página e os dados de identificação da empresa ou pessoa física.

Fique atento ao posicionamento dos Tribunais

Tendo em vista que nos últimos anos houve um exponencial crescimento das vendas online, torna-se imperioso entender o posicionamento dos tribunais com relação à responsabilidade das plataformas de e-commerce marketplace – anunciantes e intermediadoras – com relação às fraudes cometidas nas plataformas.

Em suma, as plataformas anunciantes, que apenas disponibilizam o website como vitrine aos vendedores e não participam das transações, não podem ser responsabilizadas pelas vendas, justamente porque não realizam qualquer intermediação ou interferência no negócio jurídico.


[1] Teixeira, Tarcísio. Comércio Eletrônico – conforme o marco civil da internet e a regulamentação do e-commerce no Brasil. 1. Ed. Editora Saraiva, 2015, pp. 138-149; e SANTOS, Manoel J. Pereira. Responsabilidade civil dos provedores de conteúdo pelas transações comerciais eletrônicas. In: Responsabilidade Civil na Internet e nos demais meios de comunicação. 2. E. São Paulo: Saraiva, 2012, pp. 146-166.

[2] LEONARDI, Marcel. Responsabilidade dos provedores de serviços de internet. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2005, p. 186

Leonardo Machado

Advogado integrante do escritório Battaglia & Pedrosa Advogados, formado e pós-graduando em Processo Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com atuação profissional na área cível.

leonardo@bpadvogados.com.br

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